quinta-feira, janeiro 24, 2008

Amor

Era um escritor que nunca havia tido problemas. Nunca esquentava a cabeça com nada. Toda a sua vida havia sido tranqüila. E os textos lhe vinham com facilidade à mente.

Nunca havia tido uma companheira fixa. Tinha ocasionais namoradas. Mas nunca permanecia com elas muito tempo. Elas duravam o mínimo para serem lembradas e o máximo até o chamarem de “meu amor”. Quando demonstravam sentimentos, eram inevitavelmente “dispensadas”, por assim dizer. E ia vivendo de loira em morena, de ruiva em mulata.

Aos sessenta anos, sentiu a primeira pontada da solidão. E doeu. Traduziu-se em uma primeira noite insone, com pesadelos. Ele nunca antes teve problemas para dormir. Mas, daquela noite em diante, os teria.

Ao sentar-se diante da máquina de escrever, o inimaginável. As idéias não vieram. Por quê? Começava a se apavorar. O que estaria acontecendo com ele?

Já não era mais um garoto. As necessidades do amor se tornaram fortes. Não era mais de sexo que precisava. Queria carinho, conforto, atenção e afeto. Queria uma companheira. Precisava de uma. E estava perdido. Havia passado mais de 30 anos dispensando todo o tipo de mulher.

Para ele, casar era desnecessário. Só que agora sentia o porquê de se casar. Não possuía ninguém com quem conversar à noite. Não compartilhava suas experiências. Adoecia e não tinha quem cuidasse dele. Não havia filhos. Estava abandonado no mundo.

Então ele saiu de casa com a resolução de vasculhar a cidade em busca do amor.

Foi em incontáveis lugares. Virou a cidade de cabeça pra baixo. Em cada rua, cada viela, ele procurou. Sentiu-se cansado e desesperado. E se tivesse, sem saber, mandado o amor embora? Ele iria querer voltar?

Sentou-se num banco de praça, colocou a cabeça entre as mãos e chorou. Sua vida seria um inferno constante. Pagaria o carma dos corações que partiu a vida inteira. E morreria sozinho.

Assim seria, se não fosse por um pequeno detalhe. A mulher que se sentou ao lado dele no banco da praça. Quando ele sentiu seu perfume, ergueu a cabeça e a encarou. Tinha longos cabelos negros e uma beleza balzaquiana de balançar a mais sólida das rochas. Ela o olhou de volta, admirada de seus olhos vermelhos e do rosto molhado. A isso se seguiu um breve diálogo.

“Você é o amor”? – Ele perguntou
“Posso ser” – Ela respondeu.

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